terça-feira, 26 de janeiro de 2016

46º Capitulo: “Diga-me, ela pode voltar a ter filhos?”

- Estás aí? – perguntava Marcos a uma Ania que parecia estar noutro planeta que não aquele.
- Estou, mas...
- Mas? O que é que se passa?
- Era o Dr. Castro. O meu médico...
- Sim. E? – Marcos estava completamente aflito por não ouvir grandes coisas da boca de Ania – fala de uma vez!
- Calma, não fales assim comigo!
- Desculpa – Marcos aproximou-se da mulher, agarrando-lhe as mãos – desculpa.
- Tenho de fazer mais uns testes. Ele está a achar tudo muito estranho com os valores das análises e quer que eu faça uma ecografia diferente. Para ver melhor o útero.
- Mas ele desconfia que haja alguma coisa de errado?
- Não sei. Quer dizer, ele disse que estava tudo muito anormal... – Ania olhou-o – depois de dois meses a batalharmos com o Martín...eu tenho de estar bem para receber o meu sobrinho, Marcos.
Desde o aniversário de Morena, em Agosto, tinham passado dois intensos meses. Dois meses onde Ania e Marcos se uniram enquanto casal para convencerem Martín da ideia de Ania ser a barriga deles. Dois meses onde a esperança se manteve sempre intacta e tinha culminado com a previsão de vir a existir mais um bebé na família. O bebé de Romina e Martín.
- Calma. Vai estar tudo bem...vamos acreditar que isto se trate apenas de mais testes para garantir que, tanto tu como o futuro bebé estão bem – Marcos puxou-a para si, beijando-lhe a testa – quando é que temos de lá ir ao médico?
- O mais depressa que conseguirmos. Quanto mais depressa fizer os novos testes, mais depressa poderemos avançar com tudo. E, por favor, vamos a esta bateria de exames só os dois.
- Podes ficar descansada que me terás sempre a teu lado – Marcos temia todo aquele processo. Ainda não tinha conseguido falar abertamente sobre tudo com Ania, ainda não lhe tinha conseguido dizer quais os seus medos e receios...nem as suas verdadeiras vontades. Mas sabia que, mais cedo ou mais tarde, teria de o fazer. Podendo pôr em causa todo o seu relacionamento.


- O que é que acha, doutor? – perguntava Ania, livrando a sua barriga daquele gel frio – conseguiu ver algo de conclusivo?
- Vamos sentar-nos ali à secretária para eu ter os resultados das análises que fizeste comigo – e pronto, Ania sabia que aquela conversa não poderia trazer boas notícias.
Todos foram até à secretária do médico e Ania depressa sentiu a mão de Marcos procurar a sua. Ania olhou-o, passando a sua mão pela cara do marido.
- Como devem saber – começou o Dr. Castro por dizer – para todo o processo se dar, o óvulo fertilizado da Romina teria de ser implantado no teu útero Ania.
- Sim...
- E como tu és irmã de um dos intervenientes, só o poderias fazer no Brasil.
- Poderia...?
- Neste momento o teu útero não é viável para uma gravidez. Depois de todo o procedimento, irias acabar por não suportar a gravidez.
- O bebé nasceria prematuro?
- Não. O bebé não chegaria a nascer. Qualquer óvulo que se instale no teu útero, neste momento, acabará por se despegar das paredes uterinas...
- Então, mesmo que eu engravidasse por mim mesma...
- Irias acabar por sofrer um aborto espontâneo. Eu lamento muito.
- Mas ela poderá voltar a ter filhos? – Marcos, que se mantinha à margem, acabou por fazer aquela pergunta.
- O que é que isso interessa agora? – Ania, numa atitude irreflectida levantou-se saindo do consultório.
- Diga-me, ela pode voltar a ter filhos? – Marcos não hesitou em continuar aquela conversa com o médico. Ele tinha de saber de tudo, mesmo que a sua mulher tivesse acabado de sair dali.
- Pode. Vamos ter de fazer um tratamento, regenerar o útero dela para que isso aconteça. Como sabes, desde que a Ania foi alvejada o útero dela está muito frágil. Com a gravidez das gémeas...ainda mais frágil se tornou. Creio que o próprio útero dela esteja a mudar ao longo do tempo mas vamos ter de agir para que possam ser pais de novo.
- Obrigado, doutor.
- Agora vai ver dela. Percebe o que é que ela quer fazer e, sempre que precisarem, eu estarei aqui para vos ajudar.
- Muito obrigado.
Marcos saiu do consultório do médico procurando por Ania naqueles corredores. Não a encontrou, nem quando chegou ao carro. Marcos optou por sair dali, indo direito a casa esperando que, também ela, tivesse ido para lá. Mesmo a pé conseguia chegar lá depressa.
Assim que abriu a porta de casa, o seu coração acalmou ao vê-la brincar no chão com Morena.
- Papá! – Morena, sorridente, levantou os seus braços no ar chamando Marcos para ao pé dela – papá! – Marcos sorriu, indo ter com a filha. Assim que se sentou no chão, Morena começou a gatinhar na direcção do pai – mãe deu – mostrou a Marcos uma boneca nova – é meu.
- E tu gostas?
- Sim. O Panda? – tanto Marcos como Ania se riram. Era incrível como Morena se conseguia expressar já tão bem.
- Está na hora do Panda, é? – perguntou-lhe Ania.
- Sim, pode se? Vá lá, mamã – levantou-se, correndo na direção de Ania – os binquedos e o panda.
- Tudo bem – Morena bateu palmas, pegando no comando da televisão. Entregou-o a Ania que depressa ligou a televisão no canal Panda.
- Achas que... – Ania olhou de imediato para Marcos, assim que ele começou a falar.
- Eu acho que não consigo.
- Consigues mamã, consigues – Ania deu um beijo na cabeça da filha, olhando para a televisão.
- Ficas aqui sossegadinha enquanto a mãe e o pai vão...arrumar lá fora as almofadas do jardim?
- Sim.
- Então nós já voltamos – cada um deu um beijo à filha, saindo para o jardim. Marcos deixou a porta um bocadinho aberta para que pudesse ouvir a filha caso algo acontecesse. Também a conseguiam ver.
- Estás bem? – perguntou Marcos.
- O que é que achas? Eu queria ajudá-los de alguma forma e nem isso posso fazer!
- O Dr. Castro disse que podes fazer tratamentos.
- Para quê? Para demorar mais seis meses, um ano? Ou dois? Até que consiga suportar a gravidez deles? Eles conseguem mais rápido um filho se tentarem com outra pessoa...
- Mas poderias tentar...
- Porque tu queres? Porque tu queres que eu faça esses tratamentos para que possas ter filhos outra vez? Foi por isso que fizeste aquela pergunta no médico? – Ania olhava-o e, mesmo estando alterada, conseguia falar com ele calmamente sem levantar o tom de voz.
- Nós queríamos ser pais outra vez, não era?
- Nestas condições? Eu não sei. Teria de voltar a fazer os tratamentos, teria de correr riscos ao puder ter uma gravidez como a da Morena...nestas condições eu não sei se quero voltar a ser mãe.
- Ania mas...
- Marcos, a sério...eu preciso de tempo.
- E vais voltar para La Plata? Para teres esse tempo?
- O que é que estás a querer dizer com isso?
- Só te perguntei se irias fugir ao assunto outra vez. Se irias fugir de nós como quando fugiste da tua filha.
- Bem, uau, nunca pensei que me fosses atirar isso em cara.
- Acredita que me custa estar a dizê-lo. Eu sei que te foste embora para melhorares, para te sentires bem contigo mesma...mas tu não sabes o que foram aqueles dois meses sozinho, aqui, com tudo a acontecer. Não penses que não me magoa a mim saber que tu não estás bem – Marcos olhou, por momentos, para a filha que estava toda sorridente a ver os desenhos animados – magoa-me que coloques em cima da mesa a hipótese de não termos mais filhos.
- E eu estou a constatar que tu me estás a criticar pela escolha que fiz quando a Morena nasceu – Marcos voltou a olhá-la – é isso, não é? Tu não conseguiste aceitar o que eu escolhi.
- Não, não consegui – Marcos sentia que, pela primeira vez, iriam conseguir falar sobre tudo o que se tinha passado desde que Morena nascera. Sabia, também, que poderia não correr bem e que as coisas podiam passar a ser diferentes dali para a frente – eu compreendi a tua decisão, compreendi que precisasses de tempo para ti mas não consigo aceitá-lo. Nós poderíamos ter-te ajudado aqui, tu poderias não ter saído do país para recuperar...tu não fazes ideia do que foram aqueles dois meses. Cada vez que ela acordava a meio da noite e eu olhava para a cama e não te via? Era como se tivesses desaparecido das nossas vidas, eu não sabia quando voltarias! – Marcos via que, à medida que ia falando, Ania ficava cada vez mais em baixo, como se tudo nela estivesse a desmoronar – quando eu falava de ti, pensava em ti ou, até, quando aparecias nos meus sonhos um pedaço de mim despedaçava-se, eu ficava sem saber o que fazer, o que pensar a não ser em ti. Mas eu tinha de reagir, eu tinha a Morena e não a iria deixar sozinha. As nossas mães podem ter estado connosco...mas nenhuma delas substituiu o teu lugar, nenhuma deles nos deu o conforto que precisávamos, nenhuma dela nos deu o teu amor.
Ania olhava-o, sentido o seu corpo pedir por uma pausa. Aquelas palavras de Marcos magoavam-na, mesmo que soubesse que eram a verdade. Mesmo sabendo que Marcos, pela primeira vez, se abria com ela em relação ao seu período em La Plata.
- Já que estás a ser tão sincero comigo...tu querias mesmo que eu carregasse o meu sobrinho? – Marcos, por momentos, olhou para o chão caminhando na direcção da piscina. Ania virou-se para ele, reparando que o marido tinha levado as suas mãos à cabeça e não parava de abanar a mesma.
- Eu não me importei...apoiei-te e tudo isso foi sincero, Ania – depois de levar as suas mãos à cintura, Marcos acabou por olhá-la – mas eu tinha tanto medo que isso se realizasse. Tudo o que a gravidez poderia implicar, não só com o teu estado físico mas com o psicológico...tu irias sentir esse bebé a crescer, obrigatoriamente eu também o sentiria e, por mais que soubéssemos que seria o filho do teu irmão...eu não sei se teria conseguido levar a ideia para a frente.
- Ficaste aliviado por eu não conseguir ter uma gravidez neste momento?
- Não.
- Não mesmo?
- Não, Ania – aos poucos, Marcos aproximou-se de Ania, mantendo o seu olhar preso ao dela – por mais que me metesse medo essa gravidez, nada do que se passou hoje no médico me deixa aliviado. Não é só o futuro bebé do teu irmão e da Romina que ficou mais afastado da nossa realidade...também o nosso futuro ficou afastado – Marcos olhou à sua volta, rindo-se – eu imagino esta casa cheia, eu quero tanto dar irmãos à Morena, tal e qual como nós os temos.
- Não o vamos poder fazer durante algum tempo.
- Eu sei.
- Não, não sabes – Marcos voltou a olhá-la, vendo a sua mulher começar a derramar algumas lágrimas. Tentou aproximar-se dela para as limpar, mas Ania depressa se afastou dele sendo ela a limpá-las – nós precisamos de um tempo.
- Um tempo? – como assim um tempo?
- Eu não vou fugir para La Plata, mas acho que estarei a fugir na mesma.
- E vais assim? De um momento para o outro?
- É difícil ficar assim, Marcos. Tu estás magoado comigo, estás desiludido e eu não consigo, não consigo mesmo, neste momento estar aqui, todos os dias a debater-me com os nossos problemas. Sim, eu sou egoísta e poderás odiar-me por voltar a fugir de ti mas, se nos conheces tão bem como eu nos conheço a nós, saberás que não vamos ter ambiente aqui em casa, enquanto casal ou enquanto pais – sim, Marcos sabia perfeitamente que aquilo era verdade por mais que lhe fosse difícil aceitar – eu fico por perto, posso pedir à Iara que nos aceite lá em casa.
- Desculpa, “nos aceite”?
- Sim. A mim e à Morena.
- Não. Nem penses. Tu não vais sair daqui e levar o que a vida nos deu de mais precioso. A Morena fica comigo, se passei dois meses a cuidar dela serei capaz de passar este tempo também.
- Mesmo que não saibas quanto tempo será?
- Sim. Eu também não sabia quanto tempo seria quando estavas em La Plata.
- Podes...deixá-la comigo quando fores treinar?
- Sim. Ania...mais uma vez, eu compreendo bem que precisemos de nos afastar um bocadinho. Eu posso ter sido demasiado bruto ao dizer-te tudo, num dia como o de hoje, mas...isto não és tu a desistir de nós, pois não?
- Não, Marcos. Eu nunca serei capaz de desistir do homem que mais me faz feliz. Mas eu preciso...de repensar a minha vida, de perceber o que é que temos de fazer daqui para a frente e de dar a noticia ao meu irmão e à Romina.
- Eu posso fazer isso, se quiseres.
- Não. Tenho de ser eu. Vou telefonar à Iara – Ania começou a caminhar para o interior de casa, mas Marcos agarrou-a pela mão fazendo com que a sua mulher o olhasse.
- Estás muito magoada com o que disse?
- Não, Marcos. Tu disseste o que sentias, o que realmente se passava contigo. Eu andei tão cega nestes dois meses que, se calhar, não me apercebi dos sinais que poderias ter dado. Tudo vai ficar bem, eu prometo – num gesto de ternura, Ania passou com a sua outra mão por cima da do marido, soltando-se dele.
Ania foi até à sala, vendo Morena super atenta à televisão. Sabia que, provavelmente, a menina iria sentir a sua ausência, que poderia fazer perguntas mas seria o melhor para ela. Bastou um telefonema para Iara, uma conversa direta e sincera, para ouvir do outro lado da linha um “vem quando quiseres”. E Ania foi. Nessa mesma noite.


- Mas vocês vão divorciar-se?
- Oh, André! Não ouviste o que ela acabou de dizer? – Iara acabou por repreender André, ao mesmo tempo que conseguia arrancar um sorriso dos lábios de Ania – É uma coisa temporária, eles precisam disto! Se calhar, também devias ir passar uns dias com o Marcos, não era nada mal pensado.
- Coitada da minha filha! – acabou por comentar Ania.
- Olha, não sei porquê – interveio André – todos sabemos que, mesmo que ela não admita, a Morena me ama. Ter lá o padrinho a cuidar dela só a iria deixar mais feliz.
- Acho, então, que lá podes ir várias vezes ao dia – disse Ania, olhando séria para André – assim vês se o Marcos precisa de alguma coisa e ajudas.
- Queres que eu seja o teu espião?
- Quero, André. Vá lá.
- Fica descansada, cunhada.
Ania ficava muito mais descansada. Mesmo que fosse manter contato com o marido, mesmo que o fosse ver todos os dias, precisava de alguém para o apoiar ainda mais nesta fase. Precisava de alguém que estivesse ao lado de Marcos nesta fase e André era essa pessoa sem qualquer dúvida.


Olá meninas! 
Aqui vos deixei mais um capítulo com muitas mudanças. Que estão a achar desta nova fase da história? O que acham que se vai passar daqui para a frente? Fico a aguardar pelos vossos comentários com as vossas opiniões. 
Beijinhos, 
Ana Patrícia.