Acordei com a sensação que tinha dormido anos! Parecia que tinha dormido imenso, mas ao abrir os olhos percebi que ainda é de noite. Olhei para o relógio que tenho na secretária e marcava 4h41. Não queria acordar o Marcos, mas queria olhar para ele. Quero saber como é ele quando está a dormir, pode parecer uma obsessão, mas não é.
Virei-me com cuidado para ele, que não acordou. Estava tranquilo, parecia dormir sem que nada o perturbasse, a cabeça dele estava tranquila, de certeza. Não resisti e passei com o meu dedo na bochecha dele. A sua pela era suave e estava um pouco quente.
- Não consegues dormir? - ele, do nada, falou. O que me assustou.
- Pensei que estivesses a dormir - o Marcos abriu os olhos e sorriu-me.
- Senti que te tinhas mexido e acordei.
- Desculpa. Mas volta a dormir ainda é cedo.
- E tu porque é que acordaste? - ele puxou-me para junto dele, pousando a cabeça dele no meu peito. Assustou-me, por momentos fiquei sem saber o que fazer, o que pensar ou o que dizer. Respirei...acho que me tinha esquecido de o fazer. Expulsei algum ar pela boca e comecei a fazer festinhas na cabeça do Marcos.
- Eu acordei...porque pensei que já fosse de manhã.
- Mas não é, podes voltar a dormir.
- Sim...e tu também.
Ficámos os dois bem agarradinhos e acabei por adormecer, de novo.
No dia seguinte:
Acordei com o barulho de qualquer coisa a cair. Assim que abri os olhos vi o Marcos a pegar no pote das canetas e a olhar para mim.
- Desculpa... - ele ajoelhou-se ao lado da cama, pegando na minha mão - dormiste bem?
- Sim...
- Eu vou indo, tenho treino daqui a uma hora e meia, ainda vou tomar um duche e trocar de roupa.
- Oh...claro. Eu levo-te lá abaixo - ia a levantar-me, mas ele não deixou.
- Eu sei ir e fujo do teu pai. Achas que ele já está acordado?
- Se estiver deve andar ou no quarto ou na cozinha, tem cuidado Marcos.
- Fica descansada Cinderela.
- Depois dizes qualquer coisa?
- Claro que sim. Mas eu agora tenho mesmo, mesmo de ir. Assim que acabar o treino ligo-te.
- Vai lá. E treina como deve ser e vê lá se o meu pai diz, ele que não misture o que acontece cá em casa com os treinos.
- Ele nunca o fez, fica descansada minha princesa - ele beijou-me a testa, levantando-se - ainda podes dormir mais um bocadinho.
- Acho que não consigo. Vou fazer qualquer coisa.
- Tu é que sabes...mas vais ficar bem, não vais?
- Sim...com falta de ti, mas devo ficar - ele voltou a dar-me um beijo na testa e preparou-se para sair do quarto - ei! - antes que ele saísse, levantei-me indo ter com ele.
- Hã?
- Anda cá... - puxei-o, de novo, pelo fio dando-lhe um beijo nos lábios. Aqueles lábios que eu quero beijar a todo o instante e não sei como o fazer.
O Marcos ficou um bocadinho, talvez, sem saber o que fazer. Levei as mãos dele para a minha cintura e deixei as minhas passearem pelas suas costas durante os largos minutos que ficámos a beijar-nos - agora sim: tem um bom treino - disse interrompendo o beijo.
- E tu tem uma óptima manhã - ele deu-me mais um beijo e saiu do quarto.
Fui até à janela do meu quarto que dava para ver a parte da frente da casa. Assim via se ele saia ou não. Pouco tempo depois já ele estava fora do portão e eu muito mais descansada por ele não ter encontrado o meu pai.
Nisto, batem à porta.
- Ania? - era a minha mãe.
- Entra - ela entrou, já estava toda arranjadinha.
- Bom dia, filha - caminhei na direcção dela, dando-lhe dois beijinhos.
- Buenos dias, madre.
- Vi o Marcos.
- Viste?
- Sim, ele estava já ao pé da porta. Ainda falei um bocadinho com ele, mas já foi embora.
- Eu vi...de que é que estiveram a falar?
- Nada de especial...só se tinham dormido bem.
- Mãe, sabes bem que não aconteceu nada! Não faças filmes desses!
- Ania, eu sei filha. Mas como as tuas primeiras noites foram complicadas...
- Mas agora é diferente, mami. O Marcos faz-me bem e com ele é diferente.
- Tu gostas muito dele, não gostas?
- Mami...ele é o rapaz dos meus sonhos.
- Oh filhota - ela puxou-me para ela, abraçando-a. Apesar de ser mais alta que a minha mãe sabia bem os abraços dela - se ele te faz feliz eu estou a teu lado. E o teu pai mais cedo ou mais tarde vai ver que o que vocês sentem um pelo outro é a serio.
- Eu espero que sim - olhei a minha mãe, que me sorria - tanto a parte do pai como a parte de ser sério.
- Vocês são os dois especiais. Eu vejo isso.
- Somos normais mãe...
- Não são não. És a minha menina e eu vejo que estás mais mulher ao lado dele. Com o que te aconteceu nunca pensei ver-te um dia assim.
- Nem eu mãe...
- Olha, o Martín e o Francisco querem vir cá, mas querem saber se tu não te importas que eles venham.
- O Lucas não vem?
- Eu falei com o Martín e ele só falou nele e no Francisco.
- Hum...mas sim, claro que quero que eles venham.
- Então vou avisá-los. Vai tomar o teu duche e vestir-te. Depois desce para o pequeno-almoço.
- Sim.
Sendo que só vem o Alonzo e o Francisco e devem vir as minhas cunhadas, sempre é melhor do que vir o Lucas atrás...não estou para levar com ele, não depois da "conversa" de ontem.
Fui tomar um duche e vestir-me, já estava na hora e queria ir tomar o pequeno-almoço com o meu pai a ver se ele dizia alguma coisa.
Desci as escadas até chegar ao hall de entrada. Fui até à cozinha onde já estavam os meus pais.
- Bom dia - disse ao entrar e fui ter com o meu pai dando-lhe dois beijinhos.
- Bom dia, filha. Dormiste bem?
- Sim...
- Ainda bem. A tua mãe toma o pequeno-almoço contigo, mas eu tenho de ir para o treino do Estudiantes.
- Claro pai. Bom treino - ele levantou-se, vindo ter comigo e deu-me um beijo na testa. Foi até à minha mãe e também a beijou.
- Tenham um bom dia - ele saiu da cozinha e eu fiquei com a minha mãe.
- Os teus irmãos devem estar a chegar também.
- A Gloria e a Romina vêm? - eram as minhas cunhadas. A Romina é namorada do Martín há cinco anos e a Gloria está com o Francisco há seis e já são casados há dois.
O Lucas também é casado, com a Martina...mas as coisas ultimamente não andam bem entre eles.
- Não, vêm só os teus irmãos. Elas estão a trabalhar mas também querem estar contigo.
- Está bem.
Tomei o pequeno-almoço com a minha mãe e ainda arrumámos a cozinha antes que os meus irmãos chegassem. É com o Martin que me dou melhor. É o mais novo dos rapazes, é super diferente de mim, mas somos melhores amigos mais do que irmãos.
O Martín é tudo ao contrário de mim: é sempre o primeiro a fazer conversa, tem certezas quanto ao que quer fazer, vive a vida sem pensar no amanhã e é muito mais respondão que eu. Está a fazer uma pós-graduação em desporto. Ele quer trabalhar no meio, só não sabe como.
O Francisco é mais ponderado, mas sabe divertir-se. Já trabalha numa empresa como informático e tem a vida dele estabilizada.
O Lucas...parece ser filho de pais diferentes. É o mais mal disposto de todos, não tem uma única saída mais divertida e ultimamente quando fala comigo é só a mandar vir.
Quando o Martín e o Francisco chegaram eu estava na sala e quem foi abrir a porta foi a mãe. Assim que eles chegaram à sala...senti-me um bocado diferente. Eu sei que quero agir, só não sei como.
- Piolha! - falou o Francisco que já vinha na minha direcção. Eu levantei-me, indo ter com ele. Abracei-o. Estava a fazer falta, por acaso... - oh piolha...é tão bom ver-te assim!
- Isso já devem ser milagres lá do rapazeco de ontem - comentou o Martín, chegando perto de nós, afastando o Francisco - deves pensar que a irmã é só tua - disse ele e abraçámo-nos também.
- Desculpem ontem não ter conseguido fazer nada...
- Nada disso - o Martín olhou-me, dando-me um beijinho no nariz - o que é mais importante é o que tu vais recuperando.
- E sim...são milagres do rapazeco... - acabei por admitir. Sabia que com eles era fácil de falar.
- E o pai? - perguntou o Francisco, sabendo o quanto o nosso pai não queria que eu me envolvesse com um rapaz.
- Não está a aceitar lá muito bem...mas eu não posso fazer nada. Por enquanto fica tudo às escondidas e fora de casa, porque ele não o quer cá em casa.
- A sério? - o Martín ficou um pouco espantado.
Acabámos por nos sentar e ficar grande parte da manhã a conversar. Ora sobre o Marcos, ora sobre a vida deles.
- Bem...eu tenho uma coisa para vos contar, mas eu queria que o pai cá estivesse também...e o Lucas - disse o Francisco.
- Que é que se passa, mano? - perguntou o Martín.
- Vai chamar a mãe à cozinha, se faz favor.
- Ok.
O Martín foi a correr à cozinha e voltou de lá com a nossa mãe.
- Que se passa? - inquiriu a minha mãe, meio aflita.
- Tenho de vos contar uma coisa. É sobre a Gloria.
- O que é que se passa? - tanto suspense, tanto suspense e nunca mais fala.
Ele e a Gloria têm andado com uns problemas de fertilidade. São o casal mais empenhado em ter filhos que conheço, mas não via qualquer tipo de brilho na cara do Francisco que denunciasse que iria ser pai...fiquei com medo que afinal ela tivesse um problema mais grave.